O professor de sociologia Luiz Enrique Vieira de Souza, demitido da Universidade Federal da Bahia (Ufba) após denúncias de assédio sexual, alegou ser portador de Transtorno Afetivo Bipolar, condição mental responsável por causar mudanças extremas de humor, e afirmou ter tido "surtos no momento dos fatos relatados no processo".
Em entrevista ao g1, o professor contou que toda documentação médica que comprova a condição foi apresentada à universidade. No entanto, a diretoria da Faculdade e a Reitoria teriam decidido pela demissão por causa de pressões políticas ligadas a movimentos
"Os fatos que eu realmente cometi, eu reconheci ao longo do processo. Eram coisas que eu não gostaria de ter dito, mas eu estava na pandemia, isolado, sem medicação, família, em uma condição muito fragilizada", contou o professor.
"Quando eu recobrava meu estado assintomático, eu era capaz de perceber que tinha cometido alguma coisa que não poderia ter feito e pedia desculpa. Eu disse para elas que suspeitava que estava doente, que alguma coisa acontecia comigo, mas enfim", afirmou Luiz Enrique Vieira de Souza.
O docente, que ficou afastado do cargo por cerca de um ano, informou que foi diagnosticado com Transtorno Afetivo Bipolar, por dois psiquiatras no Centro de Promoção à Saúde Universitária Rubens Brasil (SMURB).
O professor informou que a Ufba solicitou a avaliação de uma junta médica. Três profissionais do SMURB fizeram uma entrevista rigorosa e a banca do processo administrativo fez 12 perguntas.
"As respostas foram no sentido que eu era portador de Transtorno Afetivo Bipolar, de que eu já tinha essa doença anteriormente aos fatos, porque é de caráter genético e que se tratada se maneira adequada, ela pode fazer com que eu viva socialmente sem grandes danos", contou o professor.
"Mas como naquele período eu estava isolado, sem medicamentos e nenhum tipo de auxílio, não tive esse suporte", explicou.
O professor informou que a Comissão de Ética sugeriu que ele fosse suspenso por 90 dias, sem o pagamento de salários, ao invés de demitido.
"Eles aplicaram a lei, porque existe um artigo que diz que o se o servidor tiver algum tipo de transtorno mental, ela tem que responder pelo que fez, mas ela tem direito a um terço de pena a menos. Isso é um atenuante, existem pontos na legislação que reconhecem a culpabilidade, mas também reconhecem fatores atenuantes", explicou o professor.
"Foi nisso que me pautei, eu não mandei essas mensagens porque quis, eu estava alterado". Conforme o professor, a decisão por demiti-lo ignorou a recomendação técnica da comissão do PAD e os documentos médicos.
"A diretora da faculdade se orientou completamente a partir de critérios políticos, porque o manual que rege todos os processos administrativos, lá está dito que é expressamente recomendado que a decisão da comissão do PAD seja aceita".
Luiz Henrique ainda disse que a recomendação está expressa na Consultoria-Geral da União (CGU), a não ser que provas apresentadas pelas denunciantes mostrem o contrário. "Mas as provas que ela teve acesso, foram exatamente as mesmas que a comissão do PAD teve acesso", pontuou o docente.
O professor afirmou que a decisão pela demissão foi "claramente motivada politicamente e temerosa em desagradar movimentos ligados à Universidade". "Pressionada politicamente pelos coletivos que têm uma força muito poderosa dentro da universidade, preferiu salvar a reputação ao cumprir a lei", disse ao g1.
O docente disse que por causa da decisão, ele está há dois anos sendo "brutalmente linchado e ameaçado", que teve a vida "destruída", mas que vai buscar direitos através da Justiça. A assessoria de comunicação da Ufba também foi procurada e informou que não vai emitir nota sobre o caso.
De acordo com um documento emitido pela instituição de ensino, assinado na quarta-feira (22), os três episódios aconteceram em 2020 na universidade que no ano passado integrou o ranking de melhores do mundo.
As denunciantes eram duas alunas e uma funcionária da universidade. Em todos os casos, elas relataram que inicialmente tinham relações cordiais com o professor, até que ele passou a enviar mensagens de teor sexual. Em uma delas, a vítima contou que o suspeito disse que queria engravidá-la.
A primeira pessoa mulher a denunciar o professor na reitoria da universidade foi a funcionária da instituição, em 2021. Depois dela, as duas alunas prestaram as queixas. Veja o que disseram as vítimas, conforme o documento da Ufba:
A vítima 1 era aluna do professor de filosofia. Em depoimento à direção da faculdade, ela contou que ambos mantinham uma relação cordial até que em setembro de 2020, recebeu mensagens dele por um aplicativo de mensagens.
Segundo a vítima, as mensagens tinham conteúdos como "quero te beijar", "você é linda" e "quero ficar contigo". Um dia depois, o professor teria mandado outras mensagens e se desculpou pelas falas. Segundo a vítima, ele atribuiu a situação a "estar passando por momentos difíceis".
Porém, em dezembro do mesmo ano, ela recebeu novas mensagens do docente. Para a direção da faculdade, a vítima disse que ele voltou a escrever mensagens de teor sexual, onde afirmava que queria que ela engravidasse dele e ofereceu R$ 5 mil para que eles ficassem juntos.
A vítima 2 também era aluna do professor. Segundo ela, a situação começou quando foi convidada para ir até o apartamento do docente, em julho de 2020. Ela acreditou que o convite estava a associado a confraternização de um projeto onde eles atuavam juntos.
O documento não detalha o que de fato ocorreu na casa do professor, mas a vítima indica que teria sido acariciada e dopada pelo profissional. "O saldo dessa experiência é, além dos danos emocionais e da integridade psíquica, me sinto enojada e incapaz de permanecer no projeto", relatou na época.
A vítima 3 é funcionária da universidade. Ela relatou que, em outubro de 2020, foi surpreendida com uma mensagens de teor sexual do professor. Nelas, o docente fazia comentários sobre a vítima e sobre a filha dela, que tinha menos de 18 anos na época.
"[O assédio] me ocasionou grave desconforto e prejuízo emocional, com sintomas de ansiedade e insônia", relatou a vítima. A funcionária ainda disse que a situação prejudicou a atuação dela na universidade.
De acordo com o documento emitido pela Ufba, a defesa do professor apresentou laudos que comprovam que ele foi diagnosticado com transtorno bipolar, o que "não compromete o seu cognitivo, mas interfere na manifestação comportamental".
O professor assumiu a autoria das mensagens enviadas para as alunas e para a profissional, mas negou ter acariciado e dopado a aluna que foi até sua casa.
A comissão da universidade considerou o caso como situação análoga à hipótese de semi-imputabilidade do Código Penal brasileiro, que autoriza a punição do autor, mas impõem uma redução de pena.
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